É interessante como a vida pode ser irônica, em pleno dia da consciência negra recebo uma notícia de desrespeito e preconceito.
Um dos meus discente, que vou denominar de "S", residente do bairro Nova Priamavera, foi detido por policiais militares por volta das 09:40 da manhã de hoje, por causa de uma suspeita, no mínimo, estranha.
Os policiais viram uma movimentação estranha em uma incurssão pelo bairro, quando se aproximaram os suspeitos fugiram, meu discente, "S", estava longe da movimentação suspeita, mas por ter vindo da mesma direção foi abordado. Detalhe: "S" é menor de idade e estava acompanhado de seu irmão de 10 anos, quando iam fazer a limpeza ("capina") de um terrono com outros de seus colegas.
"S"foi abordado, e já sentenciado por um dos policiais, como detentor de um pacote contendo vários sacoles de drogas encontrados no local, que repito, "S" estava passando bem distante.
"S", tentanto, provar que aquele pacote não lhe pertencia, falou aos policiais que, se quisessem, poderiam olhar a sua casa. Por mais uma irônia do destino, foi encontrada uma muda de maconha no terreno baldio de sua casa. Mesmo sendo menor, e não oferecendo resistência de nenhuma espécie, "S" foi algemado e conduzido a 93a Delegacia de Volta Redonda. Seu irmão, de 10 anos, presenciou a toda a ação.
O que me deixa indignado, é que os outros dois policiais militares que acompanhavam o policial que deu voz de prisão a "S"(que, alias, também era negro), conheciam ele e sua boa indóle, vizinhos que viram a ação também falaram sobre a boa conduta do rapaz, alegando, inclusive, que o terreno baldio de sua casa era utilizado por maus elentos do bairro para consumo de drogas e outras ações. Os pais de "S", inúmeras vezes reeprenderam essas ações, mas esses maus elementos, sempre continuavam.
A vizinhança ainda tentou convencer o policial falando sobre a conduta de "S" no bairro, ele é monitor de um projeto cultural desde 2009 e auxilia a muitos jovens e adolescentes, dando conselhos e passando a sua experiência de vida. Isso de nada adiantou, e "S", menor de idade, foi levado algemado para a delegacia. Foi quando recebi a ligação e fui informado do fato. Imediatamente fui para a delegacia.
Na delegacia não havia um representante do conselho tutelar da cidade (que foi notificado, mas "não havia ninguém disponivel") nem um pisicologo ou assistente social, que são profissionais que devem estar presente quando um menor esta sendo acusado de algum crime.
Ainda bem que "S" é um rapaz responsável, e tem amigos, imediatamente após sua prisão, irregular, diga-se de passagem, vizinhos entraram em contato com representates do Grupo Amigos na Cultura, do qual "S" faz parte desde 2007, primeiro como agente cultural (discente) e, atualmente, como monitor (uma espécie de professor auxiliar).
Os pais de "S" foram notificados, seu pai, inclusive, teve que sair do trabalho para ir a delegacia, foi quando cheguei.
Logo, outros representantes do Grupo Amigos na Cultura chegaram e acionaram sua assistência jurídica. "S" ficou na delagacia de 09:50 às 14:05, e repito, se não fosse por seus familiares e representantes do Grupo Amigos na Cultura, sem qualquer assistência do Estado ou Municipio.
Quando, finalmente, "S" foi ouvido foi compravada a sua inocência, e no registro da ocorrência policial foi prescrito apenas como testemunha de uma apreensão de drogas. Todo o contragimento público, a quebra dos direitos do menor de idade ficaram sem uma compensação, mas, ao menos, o rapaz foi solto, e não condenado a uma prisão injusta.
Você pode pensar que eu estou furioso com os policiais militares, certo? Pois esta errado.
Respeito a esses profissionais, pois sei que vivem em condições precárias de trabalho, com material obsolento, tendo, inclusive, que se virar com uma única farda dada pela corporação, para o ano todo, se o policial militar quiser mais de uma farda tem que desembolsar de seus recursos particulares para tanto.
O Policial Militar do Estado do Rio de Janeiro arrisca a sua vida diariamente em defesa do cidadão fluminense, recebendo menos de R$ 30,00 (trinta reais) por dia, metade do que recebe uma diarista para limpar uma residência de classe média.
Fazer seviços extras, os famosos "bicos", não são um luxo e sim a única opção honesta desse profissionais complementarem sua renda e viverem dignamente. Eles mal conseguem oferecer segurança a si própios e suas famílias, e são perseguidos por fazerem os "bicos".
A principal funçao da PM-RJ é o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública. A PM-RJ possui 14 Unidades especiais (Uma dela é o Batalhão de Operações Policiais Especiais- BOPE). Mas muitas vezes não são capacitados ao trato público, não por culpa dos profissionais, uma vez que são treinanados como força militar auxiliar, mas por culpa do próprio estado, que não capacita esse profissionais a lidarem com as particularidades sociais, nem dão o apoio necessário a eles.
Sim, eu acredito que existem bons policiais dentro da corporação, que não se voltam para a corrupção, e só fazem o uso da força quando necessário. Muitas vezes "demonizamos" a esses profissionais, e afirmamos que todos são corruptos. Como já disse, discordo de tal afirmação.
Acredito que dentro de cada farda existe um ser humano, como qualquer um, que tem sonhos, paixões e medos. Muitas vezes olhamos somente do ponto de vista civil para os praças, mas temos, também, de nos colocar no lugar deles. Alguma vez já paramos para pensar que esse profissional e sua família correm um risco de vida constante, e que o estado não lhes oferece nenhuma forma de proteção, salvo quando uma desgraça acontece? Muitas vezes os pais e a própria sociedade (Estado e famílias) não cuidam dos seus e colocam parte, quando não toda, a responsabilidade nas autotidades policiais. Muitas vezes usadas como verdadeiros "bichos-papões".
Enquanto esperava o depoimento da ocorrência do caso do "S", li algo interressante no quadro de avisos da 93a DP de Volta Redonda. Transcrevo o texto abaixo:
Sim, senhor cidadão, eu sou um policial
(*)
Mitchell BrownMuito bem, senhor cidadão, eu creio que o senhor já me rotulou.
Acredito que me enquadro perfeitamente na categoria na qual o senhor me colocou. Eu sou estereotipado, padronizado, marcado, corporativista e, sempre, bitolado. Infelizmente, a recíproca é verdadeira. Eu não vou, porém, rotulá-lo.
Mas, desde que nascem, seus filhos ouvem que eu sou o bicho-papão, e depois o senhor fica chocado quando eles se identificam com meu inimigo tradicional, o criminoso. O senhor me acusa de contemporizar com os criminosos, até que eu apanhe um de seus filhos em alguma falta.
O senhor é capaz de gastar uma hora para almoçar e interrompe seu serviço para tomar café diversas vezes no dia, mas me considera um vagabundo se paro para tomar uma só xícara. O senhor se orgulha de seu refinamento, mas nem pisca quando interrompe minhas refeições com seus problemas.
O senhor fica bravo quando alguém o fecha no trânsito, mas quando o flagro fazendo a mesma coisa, eu o estou perseguindo. O senhor, que conhece todo o código de trânsito, quase nunca porta os documentos obrigatórios.
O senhor acha que é um abuso se me vê dirigindo em alta velocidade para atender uma ocorrência, mas sobe pelas paredes se eu demoro dez segundos para atender um chamado seu.
O senhor acha que é parte do meu trabalho se alguém me fere, mas diz que é truculência policial se devolvo uma agressão.
O senhor nem cogita em dizer a seu dentista como arrancar um dente ou a seu médico como extirpar seu apêndice, mas está sempre me ensinando como aplicar a lei.
O senhor quer que eu o livre dos que metem o nariz na sua vida, mas não quer que ninguém saiba disso.
O senhor brada que é preciso fazer alguma coisa para combater o crime, mas fica furioso se é envolvido no processo.
O senhor não vê utilidade na minha profissão, mas certamente ela se tornará valiosa se eu trocar um pneu furado do carro de sua esposa, ou conduzir seu menino no banco de trás do carro patrulha, ou talvez salve a vida de seu filho, ou trabalhe muitas horas além de meu turno procurando sua filha que desapareceu.
Assim, senhor cidadão, o senhor pode se indignar, proferir impropérios e se enfurecer pela maneira pela qual executo meu trabalho, dizendo toda a sorte de palavrões possível, mas nunca se esqueça de que a sua propriedade, a sua família e até a sua vida dependem de mim e de meus colegas.
Sim, senhor cidadão, eu sou um policial.
(*)
Mitchell Brown, autor deste texto, patrulheiro da Polícia Estadual de Virgínia, EUA, morreu em serviço dois meses depois de o escrever.Esse texto me sensibilizou, e fez refletir...
De maneira alguma concordo ou tento aqui justificar os erros cometidos no caso do "S". Mas entendo melhor por que eles ocorreram.
Volto a pensar nesse dia como um dia que devemos celebrar a vida. Nunca concordei com o fato do dia da Consciência Negra ser celebrado no dia da morte de Zumbi dos Palmares, adimiro Zumbi e sua história e sei que o exemplo que ele deixou foi de luta e perseverança. Então por que lembra-lo no dia sua morte? Digo não! Devemos celebrar seu exemplo de vida, não só o dele, mas como o de Mariana Criola, Ganga Zumba, João Candido, Machado de Assis e tantos outros, só para citar os negros brasileiros.
A luta contra preconceito continua, e não só o de cor, mas também o religioso, sexista, político, geográfico e, principalmente, o financeiro. No caso desses dois últimos, considero os mais acintosos no Brasil. No caso de "S", afirmo (apesar de saber que as autoridades policias não concordam com minha opinião, direito delas) que ele foi abordado por ser negro, de uma condição finaceira não elevada e, principalmente, por ser morador do bairro Nova Primavera. O determinismo geográfico nesse bairro, que é o de menor IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de Volta Redonda-RJ, é muito grande. Para muitos, morar lá é sinônimo de "bandido".
Pois digo algo, trabalho no Nova Primavera desde 2007, nunca fui assaltado lá, apesar de sempre andar com materiais muito caros como: computadores, projetores, DVD e sons, para a execução de meu trabalho. Nunca me agrediram verbal ou fisicamente, apesar de, no meu ramo de trabalho, sempre confrotar os jovens e adolescentes com normas de ética, cidadadania, empreendedorismo e traquejo social, que muitas vezes conflituam com os ensinamentos caseiros desse jovens. E ficaria listando aqui mil laudas das qualidades dessa comunidade.
Como todo bairro, o Nova Primavera tem suas qualidades e virtudes. Por isso não adimito a imagem depreciativa dado a ele. Hoje é dia de reflexão, de respondermos a pergunta: Aonde você guarda o seu preconceito?
Só para responder, o preconceito não pode ser guardado, mas sim excutado, sumariamente, do cerne de nosso âmago. Eu continuo acreditando em uma sociedade justa e igualitária.
Uma sociedade sem preconceitos, independente da forma.
Eu acredito em meu país, espero ver um Brasil que não precise de uma secretaria de igualdade social, pois seremos julgados pelas nossa ações, e não pela cor da nossa pele.
Um país que não precise de cotas para negros e outras "minorias" ( reflitam bem sobre essas àspas), pois as universidades serão para todos, indistintamente. Pois a educação, desde sua base, será de qualidade, não precisando que o trabalhor pague duas vezes sua universidade, quando faz sua graduação em uma instituição privada, enquanto uma pequena parcela elitizada da população ocupam todas as vagas das universidades públicas.
Quero acreditar que estou lutando, e trabalhando, por um Brasil onde casos como o de "S" não se repitam.
20 DE NOVEMBRO – DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA Consciência! Perante Deus somos todos irmãos e perante a lei somos todos iguais.
Respeito
Zumbi e sua história, mas não quero celebrar a sua morte. Quero
celebrar a vida e a liberdade.
Zumbi, e tantos outros, deixaram um
legado de luta, vida e liberdade.
Zubi morreu, mas Cristo ViVE!!!