Brasil em 2022: 106 milhões de evangélicos e 575 mil igrejas
Não é de hoje que o crescimento evangélico tem despertado a atenção da mídia braseileira. E tem chamado a atenção tanto no aspecto positivo quanto negativo. A projeção do crescimento dos evangélicos para esse ano ultrapassa da casa dos 50 milhões. Contudo, precisamos pensar além dos números? O que mudou na sociedade com tanta gente nas igrejas?
1) A projeção da Sepal mostra que mais da metade dos brasileiros será evangélica em 2022. Como foi feita esta pesquisa?
De 1990 até o ano 2000, a população evangélica cresceu de 9,4% para 15,4%, ou seja, 6 pontos percentuais. Isso comprovou o crescimento dos evangélicos nesse período em cerca de 1.300.000 pessoas por ano, 109.000 por mês e 3.630 por dia (de 13,7 milhões em 1990 para 26,02 milhões em 2000). Baseado nos crescimentos populacionais e no nosso caso, religioso, o Instituto estima o crescimento para os próximos anos. Olhando para esse quadro, chegamos hoje à casa de aproximadamente 23,8% da população evangélica, em uma população de 191,6 milhões de pessoas. Isso equivale a cerca de 45 milhões de evangélicos. Esse número é comprovado pela pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha em março de 2007. Essa pesquisa de levantamento por amostragem com abordagem em pontos de fluxo populacional chega a uma margem de erro máxima decorrente desse processo 2 pontos percentuais para mais ou para menos considerando um nível de confiança de 95. Nessa pesquisa foram encontrados 64% de católicos, 17% de evangélicos pentecostais e 5% de evangélicos não pentecostais (22% somando os dois; dentro da margem de erro chegaríamos a 20 ou 24%).
Assim, chegamos à projeção feita para 2022. Com base nesses dados e se a população continuar crescendo na mesma proporção atual, projetamos uma porcentagem de cerca de 51,4% da população evangélica em 2022, ou seja, aproximadamente 106 milhões de evangélicos para uma população de 207,1 milhões. Há confiabilidade nesses dados? Sim. A confiabilidade dessa projeção é 95%. Se por um acaso errássemos em 2 pontos percentuais para mais ou para menos, chegaríamos a 48% ou a 52% de evangélicos. Isso num universo tão grande e complexo não é considerado como erro, mas como ajuste.
2) Quem seriam esses evangélicos em 2022. Neopentecostais em sua maior parte?
O IBGE divide os evangélicos em duas subcategorias principais: evangélicos de missão, que seriam os que chamamos de históricos (presbiterianos, batistas, metodistas, menonitas, adventistas etc.), e evangélicos de origem pentecostal. Nesse último, estão inclusos também os neo-pentecostais. Os evangélicos pentecostais e neo-pentecostais normalmente crescem mais que os evangélicos de missão. Isso se deve a dois fatores principais: comunicação de massa e pregação extremamente voltada para salvação.
Para responder a pergunta, precisamos pensar em duas vertentes. A primeira é a numérica. De acordo com a projeção para 2020, os neo-pentecostais crescerão muito, em torno de 6,7%, mas não ultrapassarão os pentecostais. Isso acontecerá porque os pentecostais são a grande maioria e seu crescimento girará em torno dos 7,5%. Portanto, os dois subgrupos crescerão praticamente na mesma medida e somando os números no final, a proporção deve ser mantida.
A segunda vertente é a de como o movimento evangélico tem se comportado ultimamente. O que tem acontecido é que muitos elementos do que chamamos de neo-pentecostais têm sido absorvidos pelos pentecostais e também pelos evangélicos de missão. Esse sincretismo evangélico deve desfigurar ainda mais a religiosidade evangélica brasileira. Daqui para 2020, devem surgir muitas outras denominações que abraçarão elementos que convém à sua própria religiosidade.
3) E as igrejas, tende-se a multiplicar?
Como os evangélicos cresceram substancialmente nos últimos anos, é de se esperar que o número de igrejas também cresçam. Em 2002, fizemos pesquisas em várias cidades do país de tipos diferentes, tanto grandes cidades, como cidades do interior e vilarejos. Essas pesquisas indicaram que 6,5% da população brasileira que se dizia evangélica freqüentavam a igreja num domingo típico, o que correspondia a 70 pessoas por igreja. Existem igrejas com freqüência muito maior, mas também existem igrejas com freqüência muito menor do que essa, portanto, 70 pessoas seria a média estimada de pessoas presentes num culto aos domingos.
Nesse mesmo ano, 2002, a porcentagem de evangélicos no Brasil era 17,22% o que nos leva a concluir que: 1. 70 pessoas corresponde a 6,5% de evangélicos que freqüentam os cultos aos domingos; 2. e se 70 corresponde a 6,5%, quantos correspondem a 17,22% da população que seria evangélica no país? 3. dividimos 17,22 por 6,5 e multiplicamos por 70, chegamos ao número de 185,44. Podemos usar a média de 185 evangélicos por igreja para estimar o número de igrejas no Brasil até reavaliar o tamanho médio das igrejas e freqüência. Á medida que a igreja cresce, a razão membresia/freqüência tende a cair.
Assim sendo, usando essa média, chegamos a 289.701 igrejas em 2010, e ao incrível número de 575.402 igrejas em 2022.
4) Questiona-se muito como seria essa maioria evangélica no Brasil, já que hoje já existem evangélicos nominais e que só buscam vantagens materiais . O que mudaria de fato no país com uma maioria evangélica?
A questão do nominalismo deve avançar e muito. Isso acontece com todas as religiões a partir da terceira, quarta geração daqueles que se convertem. Para se ter um exemplo da questão nominal, a cidade mais evangélica do Brasil, Quinze de Novembro (RS), tem cerca de 80,4% de evangélicos e a sua cidade vizinha Alto Alegre, a 20 km de distância, tem apenas 0,28% de evangélicos. A mais evangelizada ao lado de uma das cidades menos evangelizadas do país. Outro exemplo se localiza na cidade de Timbó, Santa Catarina. Com uma grande estrutura eclesiástica, a igreja Luterana tem mais de 15 mil membros no seu rol, mas apenas 40 pessoas freqüentam os cultos dominicais que acontecem quinzenalmente.
Será que a vida num país de maioria protestante pode mudar? A resposta para essa pergunta depende de como a liderança se comportará daqui para frente. O que temos no Brasil hoje é uma liderança despreparada em sua maioria e carente de direção na teologia, eclesiologia e missiologia. Um fator que nos ajuda a responder essa pergunta vem do crescimento econômico, onde a classe média deve dobrar nos próximos anos isso, atraindo gente com o “olho gordo” nessa fatia da população, ou seja, líderes materialistas com forte vocação para a teologia da prosperidade. Escândalos como o da Igreja Universal devem pipocar cada vez mais, manchando a reputação dos evangélicos e interferindo numa possível mudança da nação.
Outra característica que devemos levar em conta para responder essa pergunta é a superficialidade da vida do povo brasileiro. Vemos isso presente no meio evangélico brasileiro e deve continuar assim pelos próximos anos, acelerando a dualidade entre “vida religiosa” e “vida secular”, que já existe hoje. Isso se deve principalmente ao que Gerd Theisen chama de função compensatória da religião. (Gerd THEISEN, Sociologia do Movimento de Jesus, p. 128). Essa função se mostra de forma cognitiva na formação de uma contra-imagem da realidade social. Karl Marx define o caráter compensatório da religião: “A miséria religiosa é, por um lado, a expressão da miséria real e, por outro, a protestação contra a miséria real. A religião é um suspiro da criatura oprimida, a alma de um mundo desalmado, assim como é o espírito de uma situação carente de espírito. É o ópio do povo.” Ou seja, qualquer impulso humano gerado por uma insatisfação de nível político, econômico ou social pode ser desviada para objetos religiosos, assim essas insatisfações não são externadas como revoltas sociais, mas são exteriorizadas para um objeto religioso (Deus, oração, culto, rito, sacrifício). Nesse sentido, a religião funciona como repelente de “impulsos existentes para objetos substitutivos” e ainda “descarga e neutralização de tensões sociais” .
Há ainda outro fator que se leva em consideração para responder essa questão é o egoísmo e o individualismo presente nesses dias, externando também na vida religiosa. Muito embora, parte do povo evangélico se preocupa com o próximo, uma outra parte, e poderíamos afirmar a maioria, se preocupa apenas com o seu bem-estar. Isso não provoca mudanças sociais, porque o mais importante é defender o que é seu. Uma espécie de anarquia disfarçada de religiosidade.
Outro fator para ajudar responder a questão é a desunião do povo evangélico. Não estou falando de algo utópico como uma só denominação evangélica, mas de uma instituição forte que represente os evangélicos, em sua maioria, e que grite alto pelos interesses pautados na Palavra de Deus.
É por esses fatores que, olhando mais a fundo, a religiosidade evangélica não deve transformar a vida do povo brasileiro em sua estrutura, mas o atingirá apenas de maneira superficial.
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